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quarta-feira, abril 24, 2024

IMAGENS E LETRAS

Através da Teoria de Desenvolvimento, podemos encontrar pontos concordantes nas abordagens de Ferreiro e Luria. As duas consideram que a escrita é um processo histórico. E esse processo já começa mesmo antes da criança entrar na escola. Assim, irão utilizar esse processo histórico para explicar e caracterizar esse desenvolvimento da escrita.

Para Emilia Ferreiro, esse processo é mensurado em quatro fases: pré-silábica, silábica, silábico-alfabética e alfabética. Assim predomina a relação entre a oralidade e a escrita. Opostamente, Luria acredita na continuidade, e que o processo está baseado na relação entre gestos, o visual, o brinquedo e a escrita.

Assim, a atividade simbólica é entendida como conseqüência da atividade mental, que se torna complexa gradativamente. Então, as duas abordagens apontam para o caráter simbólico do sistema.

Ferreiro e Luria também concordam que a escola apresenta, erroneamente, um caráter mecânico para as técnicas motoras relacionadas ao desenho de letras e associações de formas sonoras a formas gráficas e sua possível memorização.

Com relação ao percurso genético, ambas lançam mão do recurso auxiliar da história da constituição social da escrita como objeto cultural, mesmo recorrendo a diferentes fontes. Já os dados históricos são tomados como referência para supormos a respeito do processo psicológico que for mais difícil de captar.

As duas abordagens aconselham a necessidade de aprofundamento científico, iniciando uma nova significação para o tema da aprendizagem na escrita. O conhecimento apóia a reflexão sobre o ensino sistemático na escola e o anterior a ela, sua interação, além de considerar a natureza dos objetos de aprendizagem e às especificidades e complexidades inerentes ao seu processo de aquisição.

A seqüência genética de aquisição segundo Ferreiro e Teberosky:

Há a necessidade de explicar o processo que as crianças aprendem a ler e escrever.

Existe repetência e desistência principalmente nas séries iniciais da escolarização, e de escolas públicas. O método de ensino vem sendo apontado como principal sujeito. Com isso, temos uma crítica a respeito do melhor método de ensino da leitura e da escrita. Esse discurso não pode privilegiar algum tipo de habilidade perceptiva, e deixar de lado a competência lingüística das crianças e suas capacidades cognitivas.

As duas autoras acreditam que vale o postulado de que o conhecimento é muito mais contribuinte da direção e enquadramento dos objetos aos esquemas de ação do indivíduo.

A obrigatória acomodação dos esquemas de assimilação às particularidades dos objetos e, portanto, aos dados de experiência é sempre monitorada pelo próprio esquema de assimilação e não decorre, conseqüentemente, de eventos puramente perceptuais.

Em relação aos métodos sintético e fonético, as autoras explicitam que o iniciante deve associar fonemas da fala a sinais gráficos, residindo nessa correspondência adequada o ponto crucial da aprendizagem. Então, a discriminação auditiva é uma competência prévia à “boa aprendizagem” da escrita.

Agora, já em relação aos métodos analíticos, o reconhecimento global de palavras ou unidades maiores é o elemento fundamental e, logo, a capacidade de realizar discriminações predominantemente visuais torna-se pré-requisito principal a ser satisfeito como preparação para a escrita.

Ambos os grupos têm como ponto de partida a mesma concepção de quem está aprendendo, vinculada ao associacionismo como teoria de aprendizagem, com ênfase em discriminações perceptuais necessárias à aprendizagem da escrita, reduzindo-a a associação de respostas sonoras a estímulos gráficos.

Os objetos de conhecimento dependem da disponibilidade de instrumentos cognitivos decorrentes do próprio aparato cognitivo. O percurso desse aspecto e a própria constituição do sujeito de conhecimento, na teoria piagetiana, parecem imanentes à construção endógena, apenas marginalmente afetada pelas demandas do ambiente cultural. Há dificuldade de integração e localização do papel do ensino em relação ao desenvolvimento.

O ensino e as intervenções organizadas sobre o desenvolvimento são dificilmente articulados na compreensão da aprendizagem, que parece estar mais associada ao percurso natural do desenvolvimento.

Na linguagem escrita, os postulados da lingüística constituem a base para se argumentar pela falta de isomorfismo entre linguagem falada e escrita e utiliza-se como evidência o desconhecimento de qualquer escrita alfabética que tenha realizado com precisão a relação entre sonoridade e grafismo.

A escrita precisa ser compreendida como representação apenas quando a criança é estranha ao sistema. Depois, deve-se aprender a correspondência entre sons e grafias a fim de existir transcrições de um código a outro.

Notamos claramente em Vygotsky: a complexidade da escrita como signo de segunda ordem existe no período de iniciação do uso da escrita. Uma vez de posse do sistema, a escrita volta a ser signo de primeira ordem, e não mais intermediada pela fala.

Opostamente, em Emília Ferreiro, o sujeito trabalha com a assimilação que seu desenvolvimento cognitivo lhe provê deturpações do objeto, em razão do caráter de seus instrumentos cognitivos. Essas deformações explicitam a lógica desse processo de aquisição.

Em suas situações experimentais, com crianças pré-escolares ou iniciantes da aprendizagem da escrita, o objetivo era identificar critérios formais relativos às características que a escrita deva ter para ser reconhecida como tal.

Concluindo, Ferreiro indica que as crianças constroem “teorias” sobre a linguagem escrita, em níveis ou fases de aquisição. Nesse processo evolutivo, existe a possibilidade de seriarmos três períodos: distinção entre icônica e não-icônica; construção de diferenciações entre o que se escreve, com critérios quantitativos; incorporação de recursos de fonetização na escrita.

A seqüência genética de aquisição da escrita segundo A.R. Luria:

Claramente influenciada por Vygotsky, Luria resgata a forma de como a escola trabalha com o ensino da linguagem escrita, com pouca importância para a escrita no desenvolvimento cultural da criança. Para Vygotsky, a própria necessidade de uma sistematização no ensino cria situações artificiais em que a linguagem viva fica de lado, ao contrário do que ocorre com a fala.

Com o processo de desenvolvimento e surgimento de novas formas, percebem-se processos de redução, desaparecimento e desenvolvimento reverso de formas. Assim, para entendermos melhor, é preciso resgatar sua pré-história, a função simbólica que ele realiza em relação às entidades reais e o desenvolvimento que leva ao seu uso como signo. Isso é conseqüência de hipóteses teóricas relativas ao papel da linguagem em relação à constituição das competências tipicamente humanas.

Com a divisão de trabalho, há novas necessidades de comunicação, explicando aparecimento da linguagem. Ela ganha independência de situações práticas fazendo parte de um sistema de códigos que não depende mais do seu contexto prático. A formação da própria consciência categorial é parte da história da constituição da linguagem.

Assim, o papel de A. Luria foi recriar experimentalmente a gênese desse processo de simbolização realizado pela escrita, de modo a poder descrevê-lo sistematicamente.

A contribuição de Luria para a compreensão de como as crianças desenvolvem seu conhecimento da linguagem escrita:

Em situações experimentais, crianças pré-escolares, sem influência escolar foram submetidas a testes. Juntamente, havia uma criança já escolarizada e uma com deficiência cognitiva. Com isso observaram-se procedimentos entre esse grupo de crianças no uso do grafismo.

Eram dadas tarefas que usariam a escrita como instrumento para a memória. A criança que não sabia ler, iria ter que lembrar um conjunto de palavras e frases sem qualquer outro recurso além de sua capacidade de memorização.

Quando não conseguiam, eram encorajadas a usar então lápis e papel como ajuda, “escrevendo”. Caso a criança argumentasse que não sabia escrever, ela era incentivada a ao menos fazer algo, como os adultos fariam, apelando para a tendência de imitação.

Quem escrevia menos, imitava mais o colega mais próximo. Após isso, a criança era convidada a ler o que registrou. Isso também é um procedimento informador e mobilizador da diferenciação gráfica. A leitura imediata representa uma dificuldade, pois pode apenas expressar a intenção de escrita presente ainda no foco de atenção.

Esse tipo de acontecimento nos ajuda a captar melhor como funciona esse processo de desenvolvimento da escrita. Ela é colocada agora como recurso de ajuda para memorizar conteúdos, sendo instrumento de extensão da atividade mental.

Enquanto para E Ferreiro o ditado tinha a pertinência da palavra a um grupo semântico e a diferença da extensão lingüística dos estímulos, agora o conteúdo (significado) é o elemento central. Forma, cor dimensão, quantidade nas palavras constituiriam os fatores aos quais as crianças são particularmente sensíveis.

Há dois requisitos que são considerados condições prévias à aprendizagem da escrita: a capacidade da criança exibir sua relação com o mundo, e o controle do seu comportamento frente a esse aspecto.

Para Emília Ferreiro a diferença entre desenho e escrita está na natureza formal como sistema de signos convencionais para a criança.

Para Luria, muitas vezes há pequenas transformações psicológicas que não são facilmente notadas nos traços em si. Somados as outras manifestações é que poderiam ser adequadamente interpretados. O processo psicológico subjacente divide usos diferentes do mesmo recurso gráfico.

De um lado a representação figurativa em si, e de outro, o registro de conteúdos para além da representação pictórica, embora realizada através de recursos icônicos.

Algumas contraposições nas investigações abordadas:

É possível encontrar conceitos paralelos entre escrita imitativa (Luria) e unigráfica (Ferreiro). É uma semelhança fenotípica. No período de desenvolvimento da psicogênese temos algumas divergências.

Os estágios de aquisição são momentos mais avançados do desenvolvimento quando se comparam com vistos por Luria, argumenta Ferreiro. A concepção de linguagem escrita subjacente em cada abordagem e o papel da linguagem no processo cognitivo é outra contraposição entre os autores.

O que a interpretação focaliza é a gênese da escrita em seu sentido pleno, como signo simbólico específico do contexto lingüístico. Então descobre-se a importância do período pré-silábico onde começam a existir rudimentos de fonetização, próprios do signo lingüístico.

As relações escrita/leitura, escrito-oral são altamente complexas e a investigação que clareia esse ponto é de suma importância para o estudo teórico e a intervenção educacional.

Para Luria, a compreensão de como a criança opera através dos signos é a base de todo seu discurso. Na fala de Emília Ferreiro, teremos a descrição de como os sujeitos constroem a compreensão do funcionamento do sistema simbólico convencional que implica identificar as relações entre escrita e leitura.

A base estrutural de cada abordagem interpreta o sentido e os procedimentos da gênese da escrita de diferentes posições. Emília Ferreiro, influenciada por Piaget, prioriza construção de estruturas cognitivas endógenas mobilizadas por requisitos lógicos de compatibilidade e desenvolvimento segundo o modelo de equilíbrio, imanente do próprio organismo na relação com o meio.

Já para Luria, as funções mentais mais complexas são construídas nas condições sociais da vida humana historicamente situadas. A passagem do externo para o interno, psicológico, implica transformações das funções e dos sujeitos.

Sendo assim, conclui-se que o modelo piagetiano valoriza um sujeito epistemológico que adquire um objeto de conhecimento, enquanto na abordagem de Vygotsky, o sujeito opera com a cultura, constituindo-se em sujeito psicológico nessa interação.

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