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terça-feira, abril 16, 2024

PERÍCIAS MÉDICO LEGAIS

PERÍCIAS MÉDICO-LEGAIS

CONCEITO

Todo procedimento médico (exames clínicos, laboratoriais, necroscopia, exumação) promovido por autoridade policial ou judiciária, praticado por profissional de Medicina visando prestar esclarecimentos à Justiça, denomina-se perícia ou diligência médico-legal.

Perícia ou diligência médico-legal é, dessa forma, toda sindicância praticada por médico, objetivando esclarecer à Justiça os fatos de natureza específica e caráter permanente, em cumprimento à determinação de autoridades competentes.

Nos cadáveres objetiva diagnosticar a realidade, a causa jurídica, o tempo da morte, a identificação do morto; diferenciar as lesões intra vitam e post mortem; realizar exames toxicológicos das víceras do morto; proceder à exumação; extrair projéteis.

PERITOS

Peritos são expertos em determinados assuntos, incumbidos por autoridades competentes de os esclarecerem num processo.

É todo técnico que, por sua especial aptidão, solicitado por autoridades competentes, esclarece à Justiça ou à polícia acerca de fatos, pessoas ou coisas, a seu juízo, como início de prova. Dessa forma, aduz-se que todo profissional pode ser perito.

Perito médico é o que cuida de assuntos médicos; evidentemente, ele só pode ser médico.

NOMEAÇÃO

A escolha do perito é de alçada do juiz, o qual, tanto para o penal como para o cível, deve nomeá-lo dentre os expertos oficiais, como estabelece o art. 421 do Código de Processo Civil.

ANTROPOLOGIA FORENSE

IDENTIDADE E IDENTIFICAÇÃO

Antropologia forense é a aplicação prática ao Direito de um conjunto de conhecimentos da Antropologia Geral visando principalmente às questões relativas à identidade médico-legal e à identidade judiciária ou policial.

A identidade é o conjunto de caracteres próprios e exclusivos das pessoas, dos animais, das coisas e dos objetos. É a soma de sinais, marcas e caracteres positivos ou negativos que, no conjunto, individualizam o ser humano ou uma coisa, distinguindo-os dos demais.

TRAUMATOLOGIA FORENSE

CONCEITO

É o capítulo da Medicina Legal no qual se estudam as lesões corporais resultantes de traumatismos de ordem material ou moral, danosos ao corpo ou à saúde física ou mental.

LESÕES CORPORAIS

Lesão corporal é todo e qualquer dano ocasionado à normalidade do corpo humano, quer do ponto de vista anatômico, quer do fisiológico ou mental.

LESÕES CORPORAIS LEVES

As lesões corporais leves são representadas freqüentemente por danos superficiais, vasos arteriais e venosos de pequeno calibre. São as escoriações, equimoses, hematomas, feridas contusas, alguns entorses, os torcicolos traumáticos, edemas e a maioria das luxações.

CAUSALIDADE MÉDICO-LEGAL DO DANO

CONCEITO

São de sete ordens os grupos de energias produtoras do dano: mecânica, física, química, físico-química, bioquímica, biodinâmica e mista.

ENERGIAS DE ORDEM MECÂNICA

São as energias que, atuando mecanicamente sobre o corpo, modificam, completa ou parcialmente, o seu estado de repouso ou de movimento.

São agentes de energias:

1) armas naturais- mãos, pés, cotovelos, joelhos, cabeça, dentes, unhas;
2) armas propriamente ditas- armas de fogo, punhal, soco-inglês, cassetete, pejeuzeira, peixeira, tacape, bordura;
3) armas eventuais- navalha, lâminas de barbear, canivete, faca, barra de ferro, balaústre, bengala, tijolo, foice, facão-de-mato, podão;
4) maquinismos ou peças de máquinas;
5) animais- cão, gato, leão, macaco, onça, lobo, tigre-de-bengala;
6) meios diversos- quedas, explosões, precipitações.

As energias de ordem mecânica atuam por pressão, percussão, tração, compressão, torção, sucção, explosão, contrachoque, deslizamento e distensão.

As lesões internas ou externas podem ser produzidas pelas energias mecânicas de forma ativa, em que o agente vulnerante, possuído de força viva, ou “força de choque”, cujo efeito é proporcional a seu peso e velocidade, projeta-se contra o corpo que está parado; passivamente, quando o corpo em movimento é lançado contra o agens vulnerans, que está sem movimento aparente; ou mista, quando o corpo e o instrumento, ambos em movimento, ambos em movimento, chocam-se mutualmente.

CLASSIFICAÇÃO DOS INSTRUMENTOS MECÂNICOS

Segundo o contato, o modo de ação e as características que imprimem às lesões, classificam-se os instrumentos mecânicos em: cortantes, contundentes, perfurantes, perfurocortantes, cortocontundentes e perfurocontudentes. Destarte, eles produzem, respectivamente, feridas, incisas, contusas (e contusões), punctórias, perfuroincisas, cortocontusas e perfurocontusas.

Não existem instrumentos dilacerantes, contusodilacerantes, perfurodilacerantes, cortodilacerantes; dessa forma, não há de falar o perito em feridas dilacerantes, contusodilacerantes, perfurodilacerantes, cortodilacerantes, teoricamente produzidas por esses inexistentes instrumentos.

Desse modo, ferimento lacerocontuso nada mais é que solução de continuidade em meio a uma ação contundente, ou seja, ferida contusa.

INSTRUMENTOS CORTANTES

São os que, agindo por um gume afiado, por pressão e deslizamento, linear ou obliquamente sobre a pele e os órgãos, produzem soluções de continuidade chamadas feridas incisas.

Não existem feridas cortantes; cortantes são os instrumentos que as produzem.

A despeito de impropriedade semântica, reserva-se na prática o nome incisão ou abscisão à ferida provocada por médico em ato operatório.

Os instrumentos cortantes não serão confundidos com os instrumentos cortocontundentes, como a foice, o machado, o podão, o espadagão, a roda de trem, que agem mais pelo peso e pala força com que são empregados do que pelo gume.

A aplicação perpendicular à superfície corporal de instrumento cortante, de gume afiado, produz lesão incisa linear, salvo quando compromete pregas cutâneas, in exemplis, o cotovelo, o pulso, em que resultará lesão em ziguezague. Uma das margens será em biesel, a outra formando retalho agudo, se a incidênciado instrumentum se fizer obliquamente.

Pouco profundas, habitualmente as feridas incisas não penetram as grandes cavidades torácica e abdominal. No tórax, amiúde, os ossos detêm a marcha do instrumento. Pode ocorrer lesão das grandes articulações. No abdôme, o emprego de instrumento cortante, como a navalha, notadamente em indivíduos magros, com intensa força agressora, pode ocasionar evisceração.

Caracterizam feridas incisas:

1) Margem nítidas e regulares, quanto mais afiado seja o corte do instrumento utilizado.
2) Ausência de lacínia de tecidos no fundo da lesão, explicada pelo afiamento do instrumento.
3) Ausência de contusão em torno da lesão, porque o gume se limita a seccionar os tecidos, sem mortificá-los.
4) Predomínio sobre a largura e a profundidade, que se mostra sempre mais acentuada na parte média da ferida.
5) Extremidade distal habitualmente mais superficial que a extremidade proximal e em forma de cauda de escoriação. A cauda de escoriação ou cauda de saída é produzida na epiderme no instante que precede a ação final do instrumento sobre a pele. Desse modo, é a cauda de escoriação observada na extremidade distal do ferimento inciso, onde o instrumento cortante foi afastado do corpo. Tem importância para indicar a causa jurídica de morte e a postura adotada pelo agressor. Importa saber que a cauda de escoriação pode faltar.
6) Vistas, teoricamente, em corte perpendicular, teriam aspecto angular em V, de abertura externa, se o instrumento cortante agiu linearmente.
7) Hemorragia geralmente abundante, consoante o grau de vascularização da região anatômica lesada.
8) Secção perpendicular às linhas de força da pele e dos órgãos determina pronunciado afastamento das margens da ferida incisa.

Interessa ao cirurgião e ao legista conhecer a ordem de sucessão de duas lesões que se entrecruzam ou coincidem em alguns pontos, o que se faz pela coaptação dos bordos da ferida incisa que se presume ter sido produzida por primeiro. Supondo ocorra coaptação concomitante dos bordos da outra lesão- embora com uma interrupção ao atingir a anterior- , o fato indicará que ela foi provocada posteriormente, quando a primeira estava de margens abertas.

Nas melanodermas, as feridas incisas e as incisões tendem a proliferar exuberante e a constituir quelóide.

Os ferimentos incisos, com perda de substâncias, em certas regiões do corpo, como orelha, o nariz, as mamas e o pênis, amiúde geram lesões deformantes, indicativas da intenção do agressor de estigmatizar (animus deformandi) de modo permanente o ofendido.

LESÕES PRODUZIDAS POR INSTRUMENTOS CORTANTES

Os instrumentos cortantes produzem lesões no pescoço chamadas esgorjamento, degolamento e decapitação.

Esgorjamento são as lesões produzidas por instrumentos cortantes (eventualmente, por instrumentos cortocontundentes) nas regiões anterior, lateral, anterolateral, ou laterolateral do pescoço.

INSTRUMENTOS CONTUNDENTES

Instrumento contundente é todo agente mecânico, líquido, gasoso ou sólido, rombo, que, atuando violentamente por pressão, explosão, flexão, torção, sucção, percussão, distenção, compressão, descompressão, arrastamento, deslizamento, contragolpe, ou de forma mista, traumatiza o organismo.

São instrumentos contundentes: as armas naturais (mãos, pés, cabeça, joelhos), as armas ocasionais (bengala, barra de ferro, tijolo, balaústre, mão-de-pilão), as saliências obtusas e as superfícies duras (solo, pavimentos), os desabamentos, as explosões, os acidentes de veículos, os atropelamentos.

LESÕES PRODUZIDAS POR INSTRUMENTOS CONTUNDENTES

Todos eles podem agir de forma ativa, de forma passiva ou de modo misto, determinando lesões superficiais e profundas, denominadas contusão e ferida.

Contusão é a denominação genérica do derramamento de sangue nos intertícios tissulares, sem qualquer afração dos tegumentos, conseqüente a uma ação traumática sobre o organismo.

Contusão é lesão fechada com comprometimento do tecido celular subcutâneo e integridade real ou aparente de pele e das mucosas.

Ferida contusa é contusão que sofre solução de continuidade pela ação traumática do instrumento vulnerante; é contusão aberta.

CONTUSÕES

1 – ESCORIAÇÃO – a pele é formada por duas túnicas: a epiderme e a derme. Essas duas túnicas básicas de pele formam, na realidade, um sistema interligado e único. Dessa sorte, qualquer agressão comprometedora de uma das camadas terá efeito também na outra.

2 – EQUIMOSE – é o nome que se dá à infiltração e coagulação do sangue extravasado nas malhas dos tecidos, sem efração deles. O sangue hemorrágico infiltra-se nos interstícios íntegros, sem aninhamento, originando a equimose.

A equimose é superficial quando resulta da ruptura, geralmente, da capilares cutâneos, e profunda, se consequentemente a lesão de casos mais calibrosos das víceras, dos músculos ou dos ossos.

A forma das equimoses é muito variável. Em geral, mais ou menos circulares, se examinadoras decorrido pouco tempo após o trauma, podem reproduzir a forma do instrumento contundente.

Puntiformes, recebem o nome de petéquias. Serão chamadas víbeces quando tomam a forma alongada, em estrias. Sugilação é um aglomerado de petéquias; sufusão, ampla área de efusão sangüínea.

A equimose tem extraordinária importância médico-legal, pois, na maioria das vezes, permite ao legisperto:

a) precisar a sede da contusão.
b) Determinar a data provável da violência.
c) Indicar o instrumento: são sempre alongadas, em faixa ou estrias, as equimoses provocadas por cassetete, varas, correias; arredondadas, se produzidas pelas polpas digitais.
d) Afirmar a natureza do atentado: as resultantes da aplicação violenta da polpa digital, no pescoço, sugerem esganadura, e na face interna das coxas, tentativa de estupro ou atentado ao pudor.
e) Traduzir fenômeno vital: fala a favor de traumatismo no vivo a firme aderência do sangue infiltrado e até coagulado, se recente, nas malhas dos tecidos. As equimoses posteriormente à morte mostram fluidez do sangue ou fraca coagulação, não aderente às malhas tissulares.

3- HEMATOMA – é uma coleção hemática, um thrombos traumatikos produzido pelo sangue extravasado de vasos mais calibrosos, não-capilares, que desloca a pele e afasta a trama dos tecidos formando cavidade circunscrita, onde se aninha.

4- BOSSA SANGUÍNEA – é hematoma em que o derrame sangüíneo, impossibilita de se difundir nos tecidos moles em geral, por planos ósseos subjacentes, como na cabeça, coleciona, determinando a formação de verdadeiras bolsas, pronunciadamente salientes na superfície cutânea. No couro cabeludo é conhecida vulgarmente como galo.

5- BOSSAS LINFÁTICAS – denominadas derrames subcutâneos de serosidade, são coleções de linfa, provenientes dos linfáticos traumatizados, produzidas por contusões tangenciais, como acontece nos atropelamentos em que os pneus, por atrição, deslocam a pele formando grandes bolsas linfáticas entre o plano ósseo e os tegumentos.

B) – ferida contusa é solução de continuidade dos tecidos produzida por tração, explosão, arrastamento, compressão, percussão, pressão, de intensidade suficiente para vencer a resistência e a elasticidade dos tecidos moles.

É contusão aberta.

Tem caracteres próprios que permitem distingui-la das demais feridas:

a) forma, fundo e vertentes irregulares;
b) bordos escoriados;
c) deslocamento de pele próxima;
d) ângulos obtusos;
e) derrame hemorrágico externo manos intenso do que na ferida incisa;
f) aspecto tormentoso em seu interior.

INSTRUMENTOS CORTOCONTUNDENTES

São os instrumentos que, agindo sobre a pele, músculos, tendões, órgãos ou esqueleto, por pressão, percussão e deslizamento, mais pelo próprio peso e intensidade de maneio do que pelo gume de que são dotados, produzem lesões chamadas feridas contundentes.

Integram essa classe de instrumentos a foice, o facão, o espadagão, o podão, a enxada, a motosserra, a serra elétrica, as rodas de trem, os dentes, as unhas, o zargunho, a zagaia, a moenda, o mondador.

Lesões produzidas por instrumento cortocontundentes a forma das feridas cortocontusas varia conforme a região comprometida e a intensidade de manejo, inclinação, peso e o fio cortante do instrumento. Sendo o corte afiado, preponderam as propriedades distintivas das feridas incisas; caso contrário, prevalecem, nos tecidos, as características próprias de um ferimento contuso.

Habitualmente de prognóstico grave, profundas, não raro comprometem os planos subjacentes gerando hemorragias copiosas, por secção de vasos calibrosos e, inclusive, fraturas. Nos membros ocasionam mochadura. A mordida do mamilo, nariz, orelha, muitas vezes, produz por pressão e secção, deformidade permanente, conseqüente à perda de substância. A dentada no pescoço, nas mamas, na região suprapúbica, na face interna da coxa próximo aos genitais, nas costas, características dos assaltos sexuais, costuma deixar estampadas as impressões dos dentes em forma de suas linhas equimóticas em parênteses, sem efração dos tecidos ou com eles desgarradamente em bloco.

INSTRUMENTOS PERFURANTES E PERFUROCORTANTES

São perfurantes os instrumentos puntiformes, finos, cilíndricos ou cilindrocônicos, com o comprimento predominado sobre a largura e a espessura, como alfinetes, agulhas, pregos, furador de gelo, estoque, estilete agulhado, espinhos etc. agem simultaneamente por percussão ou pressão por um ponto, afastando fibras, sem seccioná-las. Os instrumentos perfurantes de forma excessivamente cilindrocônica podem, muito raramente, dilacerar algumas fibras do tecidos.

São chamados perfurocortantes os instrumentos puntiformes, com o comprimento predominando sobre a largura e a espessura, dotados de gume ou corte. O contato desses instrumentos é feito por um ponto que atua simultaneamente por percursão ou pressão, afastando fibras, e por corte, seccionando-as. Existem ainda os instrumentos de ponta e de arestas, contendo várias faces e múltiplos ângulos diedros, cortantes ou não, como a lima, a baioneta, o florete.

LESÕES PRODUZIDAS POR INSTRUMENTOS PERFURANTES E PERFUROCORTANTES

Os instrumentos perfurocortantes propriamente ditos determinam lesões em forma de ponto na pele, chamadas feridas punctórias, quase imperceptíveis, quando o instrumento for muito fino, com diminuto orifício de entrada, raro sangramento e um trajeto que, geralmente, termina em fundo de saco. O trajeto poderá aparentar desvios quando o instrumento compromete órgãos dotados de movimentos, como os pulmões, por exemplo.

Em feridas transfixante é possível orifício de saída em tudo similar ao de entrada, porém, com os bordos evertidos, quando a agressão se assesta nas mãos, braços, pernas, coxas.

Quando o instrumento for cônico e mais calibroso, o orifício de entrada e, quiçá, o de a saída tomam forma de botoeira.

O aspecto dos ferimentos na pele é definido pelas leis de Filhos e pela lei de Langer.

Primeira Lei de Filhos- As soluções de continuidade são feridas que se assemelham às produzidas por instrumentos perfurocortantes de dois gumes e de lâminas achatadas.

Segunda Lei de Filhos- Os instrumentos cilíndricos ou cilindrocônicos determinam direção constante para cada região do corpo onde as linhas de força tenham um só sentido.

Lei de Langer- Um instrumento cilíndrico, exercendo ação perfurante em um ponto da pele onde convergem linhas de força de sentidos diferentes, produz ferida triangular, ou em ponta de seta, ou mesmo em quadrilátero.

As lesões produzidas pelos instrumentos perfurantes e perfurocortantes caracterizam-se pelo predomínio da profundidade sobre a dimensão externa, podendo o agente vulnerante penetrar parcialmente no interior do corpo ou completamente, lesando paredes ósseas e vísceras ocas e/ou maciças. Pode, também, acontecer de armas relativamente pequenas, de lâminas curtas, produzirem trajetos grandes, por compressão e depressão da parede abdominal pela violência do golpe, determinando as chamadas lesões em acordeão de Lacassagne.

TANATOLOGIA FORENSE

CONCEITO

É o capítulo da Medicina Legal no qual se estuda a morte e as conseqüências jurídicas a ela inerentes.

Antes do advento da era da transplantação dos órgãos e tecidos aceitava-se a morte como o cessar total e permanente, num dado instante, das funções vitais. Supera hoje esse conceito o conhecimento de que a morte não é o cessamento puro e simples, num átimo, das funções vitais, mais sim, toda uma gama de processos que se desencadeiam inexoravelmente durante certo período de tempo, afetando paulatinamente os diferentes órgãos da economia. Baseado nisso criaram-se modernamente dois conceitos distintos de morte: a cerebral, teoricamente indicada pela cessação da atividade elétrica do cérebro, tanto na cortiça quanto nas estruturas mais profundas, pela persistência de um traçado isoelétrico, plano ou nulo, e a circulatória, por parada cardíaca irreversível à massagem do coração e às demais técnicas usualmente utilizadas nessa eventualidade. Qualquer que seja a teoria adotada, vê-se logo quão difícil é estabelecer um critério de morte.

Fiquemos, pois, apenas com as razões indiscutíveis de morte: a cessação dos fenômenos vitais, por parada das funções cerebral, respiratória e circulatória, e o surgimento dos fenômenos abióticos, lentos e progressivos, que lesam irreversivelmente os órgãos e tecidos. Assim, deve-se prudentemente deixar escoar certo lapso na ampulheta do tempo para afirmar com rigorismo clínico a realidade da morte, conforme preceitua a Sociedade Alemã de Cirurgia.

MODALIDADES DE MORTE

Existem várias modalidades de morte:

a) Morte anatômica- É o cessamento total e permanente de todas as funções do organismo entre si e com o meio ambiente.
b) Morte histológica- não sendo a morte um momento, compreende-se ser a morte histológica um processo decorrente da anterior, em que os tecidos e as células dos órgãos e sistemas morrem paulatinamente.
c) Morte aparente – p adjetivo aparente nos parece aqui adequadamente aplicado, pois o indivíduo assemelha-se incrivelmente ao morto, mas está vivo, por débil persistência da circunstância da circulação. O estado de morte aparente poderá durar horas, notadamente nos casos de morte súbita por asfixia-submersão e nos recém-natos com índice de Apgar baixo. É possível a recuperação de indivíduo em estado de morte aparente pelo emprego de socorro médico imediato e adequado.
d) Morte real – é o ato de cessar a personalidade e fisicamente a humana conexão orgânica, por inibição da força de coesão intermolecular, e o de formar-se paulatinamente a decomposição do cadáver até o limite natural dos componentes minerais do corpo.

TANATAGNOSE

É a parte da Tanatologia Forense que estuda o diagnóstico da realidade da morte. Esse diagnóstico será tanto mais difícil quanto próximo o momento da morte. Antes do surgimento dos fenômenos transformativos do cadáver, não existe sinal patognomônico de morte. Então, o perito observará dois tipos de fenômenos cadavéricos: os abióticos, avitais ou vitais negativos, imediatos e consecutivos, e os transformativos, destrutivos ou conservadores.

Fenômenos abióticos imediatos – apenas ensinuam a morte:

a) perda de consciência;
b) abolição do tônus muscular com imobilidade;
c) perda da sensibilidade;
d) relaxamento dos esfíncterer;
e) cessação da respiração;
f) cessação dos batimentos cardíacos;
g) ausência de pulso;
h) fácies hipocrática;
i) pálpebras parcialmente cerradas.

Fenômenos abióticos consecutivos:

a) resfriamento paulatino do corpo;
b) rigidez cadavérica;
c) espasmo cadavérico;
d) manchas de hipóstase e livores cadavéricos;
e) dessecamento: decréscimo de peso, pergaminhamento da pele e das mucosas dos lábios; modificações dos globos oculares; mancha de escrerótica; turvação da córnea transparente; perda da tensão do globo ocular; formação da tela viscosa.

Modo geral, admite-se em nosso meio o abaixamento da temperatura em ½ grau nas três primeiras horas, depois 1 grau por hora, e que o equilíbrio térmico com o meio ambiente se faz em torno de 20 horas nas crianças e de 24 a 26 horas nos adultos. Estes resfriam, portanto, mais demoradamente do que os velhos e as crianças. A diferença de temperatura retoaxilar no cadáver varia de 2 a 5 graus entre 2 a 12 horas após a morte.

A rigidez cadavérica é fenômeno constante no cadáver, originados por uma reação química de acidificação num estado de contratura muscular que desaparece quando se inicia a putrefação. Ou seja, o rigor mortis é explicado pela desidratação muscular que produz a coagulação da miosina associada ao aumento do teor de ácido nos músculos. Segundo um cara mané que escreve essas coisas, a rigidez não é o primeiro sinal de morte, mas o último sinal de vida. Pela lei de Nysten, nos cadáveres em decúbito dorsal, a rigidez se inicia pela face, , mandíbula e nuca, seguindo-se os músculos do tronco, os membros superiores e, por último, os membros inferiores, desaparecendo, posteriormente, na mesma ordem em que surgiu.

O espasmo cadavérico, também denominado rigidez cataléptica, estatuária ou plástica, é uma forma particular de rigidez cadavérica instantânea, sem o relaxamento muscular que precede a rigidez comum e com a qual não se confunde. O indivíduo acometido, súbita e violentamente, pelo espasmo cadavérico guarda a posição que mantinha quando a morte o surpreende.

FENÔMENOS TRANSFORMATIVO

Compreendem os destrutivos (autólise, putrefação e maceração) e os conservadores (mumificação e saponificação). Resultam de alterações somáticas tardias tão intensas que a vida se torna absolutamente impossível.

São, portanto, sinais de certeza da realidade de morte.

DESTRUTIVOS

AUTÓLISE

Após a morte cessam com a circulação as trocas nutritivas intracelulares, determinando lise dos tecidos seguida de acidificação, por aumento da concentração iônica de hidrogênio e consequentemente diminuição do pH. A vida só é possível em meio neutro; assim, por diminuta que seja a acidez, será a vida impossível, iniciando-se os fenômenos intra e extracelulares de decomposição. Os tecidos se desintegram porque as membranas celulares se rompem e flocula o protoplasma, devido às desordens bioquímicas resultantes da anóxia e da baixa do pH intra e extracelular.

PUTREFAÇÃO

Para Icard, a putrefação se inicia assim que cessa a vida.

A putrefação, forma de transformação cadavérica destrutiva, se inicia, após a autólise, pela ação de micróbios aeróbios, anaeróbios e facultativos em geral sobre o ceco, porção inicial do grosso intestino onde mais se acumulam os gases e que, por guardar relação de contiguidade com a parede abdominal da fossa ilíaca direita, determina por primeiro, nessa região, o aparecimento de mancha verde abdominal, a qual posteriormente, se difunde por todo o tronco, cabeça e membros, a tonalidade verde-enegrecida conferindo ao morto aspecto bastante escuro. Os fetos e os recém-nascidos constituem exceção; neles a putrefação invade o cadáver por todas as cavidades naturais do corpo, especialmente pelas vias respiratórias. Nos afogados, a coloração verde dos tegumentos aparece primeiramente na metade superior e anterior do tórax e, depois na cabeça, pela posição declive assumida pelo corpo dentro d’água.

Na dependência de fatores intrínsecos (idade, causa mortis, constituição) e de fatores extrínsecos (temperatura, aeração, higroscopia do ar), a marcha de putrefação, embora não siga cronologia rigorosa (tanto ser possível a simultaneidade de vários períodos transformativos, em regiões diferentes, num mesmo cadáver), se faz em quatro períodos:

1o) Período de coloração- Tonalidade verde-enegrecida dos tegumentos, originada pela combinação do hidrogênio sulfurado nascente com a hemoglobina, formando a sulfometemoglobina, surge, em nosso meio, entre 18 e 24 horas após a morte, durando, em média, 7 dias.

2o) Período gasoso- Os gases internos da putrefação migram para a periferia provocando o aparecimento na superfície corporal de flictenas contendo líquido leucocitário hemoglobínico com menor teor de albuminas em relação às do sinal de Chambert, e de enfisema putrefativo que crepita à palpação e confere ao cadáver a postura de boxeador e aspecto gigantesco, especialmente na face, no tronco, no pênis e bolsas escrotais. A compressão cardiovascular emigra sangue para a periferia originando na pele curioso desenho denominado circulação póstuma de Brouardel.

Esse período dura em média duas semanas.

3o) Período coliquativo- A coliquação é a dissolução pútrida das partes moles do cadáver pela ação conjunta das bactérias e da fauna necrófaga. Os gases se envolam, o odor é fétido e o corpo perde gradativamente a sua forma.

4o) Período de esqueletização- a ação do meio ambiente e da fauna cadavérica destrói os resíduos tissulares, inclusive os ligamentos articulares, expondo os ossos e deixando-os completamente livres de seus próprios ligamentos.

MACERAÇÃO

É também fenômeno de transformação destrutiva que afeta os submersos em meio líquido contaminado (maceração séptica) e o concepto morto a partir do 5o mês de gestação e retido intra-uterinamente (maceração asséptica). Manifesta-se mais intensamente nos casos de retenção de feto morto. Compreende três graus: no primeiro grau, a maceração está representada pelo surgimento lento, nos três primeiros dias, de flictenas contendo serosidade sanguinolenta.

SAPONIFICAÇÃO

É um processo transformativo de conservação que aparece sempre após um estágio regularmente avançado de putrefação, em que o cadáver adquire consistência untuosa, mole, como o sabão ou a cera, às vezes quebradiça, e tonalidade amarelo-escura, exalando odor de queijo rançoso. A saponificação atinge comumente segmentos limitados do cadáver; pode, entretanto, raramente, comprometê-lo em sua totalidade. Tal processo, embora factível de individualidade, habitualidade se manifesta em cadáveres inumados coletivamente em valas comuns de grandes dimensões, como nas primeiras exumações ocorridas no Cemitério dos Inocentes de Paris.

CRONOTANATOGNOSE

É a parte da tanatologia que estuda a data aproximada da morte. Co, efeito, os fenômenos cadavéricos, não obedecendo ao rigorismo em sua marcha evolutiva, que difere conforme os diferentes corpos e com a causa mortis e influência de fatores extrínsecos, como as condições de terreno e da temperatura e umidade ambiente, possibilitam estabelecer com certeza absoluta. O seu estudo importa no que diz respeito à responsabilidade criminal e aos processos civis ligados à sobrevivência e de interesse sucessório.

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