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terça-feira, abril 16, 2024

DESAPROPRIAÇÃO

Introdução:

Ao falarmos de desapropriação, logo relacionamos esta palavra com propriedade. Convém nos lembrar que a propriedade tem garantia constitucional (art. 5o, XII, CF), mas a Constituição, como que em contraponto com a garantia desse direito, exige que a propriedade assuma a condição de atender a função social (art. 5o, XXIII). Sendo assim, o Estado pode intervir na propriedade, sempre que não estejam sendo cumpridas as funções sociais, pois com a intervenção estatal, a função primordial da propriedade será desempenhada, atuar de acordo com os interesses públicos.

Essa intervenção do Estado se dá de duas maneiras: restritiva, através da qual o Poder Público retira algumas das faculdades relativas ao domínio, e a supressiva, que gera transferência da propriedade de seu dono as formas de intervenção restritiva.

Neste trabalho, analisaremos mais profundamente, uma das formas de intervenção supressiva, ou seja, aquela que provoca a perda da propriedade. Essa forma é a desapropriação.

Conceito e Espécies

Podemos dizer que a desapropriação é o procedimento pelo qual o Poder Público despoja alguém de uma propriedade e adquire, mediante indenização, fundado em um interesse público.

O fato de ser um procedimento de direito público retrata a existência de uma seqüência de atos e atividades do Estado e do proprietário, desenvolvido nas esferas administrativa e judicial. Sobre esse procedimento, incidem normas de Direito Público, sobretudo quanto aos aspectos que denotam a supremacia do Estado sobre o proprietário.

O objetivo da desapropriação é a transferência do bem desapropriado para o acervo do expropriante, sendo que esse fim só pode ser alcançado se houver os motivos mencionados no conceito, isto é, a utilidade pública ou o interesse social.

A indenização por transferência constitui regra geral para as desapropriações, só por exceção, se admitindo, a ausência de pagamento indenizatório.

Espécies de Desapropriação:

De acordo com o prof. Celso Antônio Bandeira de Melo, existem dois tipos de desapropriação no Direito brasileiro que tem indenização: a desapropriação urbanística e a desapropriação rural.

Desapropriação Urbanística

Está fundamentada na CF, art.182, ¶4o, III. Neste caso, o Estado desapropria para adequar o solo às necessidades urbanísticas expressas no plano. O expropriante será o Município que, no entanto, dependerá de lei municipal específica para a área incluída no plano diretor, e de lei federal que estabelecerá os termos em que o Poder Público municipal vai processar a desapropriação.

Desapropriação Rural

É prevista no art.184 da CF, e pode ser denominada assim, pois incide sobre imóveis rurais para fim de reforma agrária. É uma modalidade específica de desapropriação por interesse social, e tem o objetivo permitir a perda da propriedade quando esta não esteja cumprindo sua função social.

O expropriante nessa modalidade é exclusivamente a União, e a indenização, neste caso, ocorre da mesma maneira da urbanística, será paga através de títulos, e não em dinheiro. A disciplina constitucional sobre a desapropriação rural se regula ainda por mais duas leis: Lei no. 8.629, de 25.02.93, e a Lei complementar no. 76, de 06.07.93.

Além desses dois tipos, existe a desapropriação confiscatória, citada pelo prof. José dos Santos Carvalho Filho, prevista no art. 243 da CF, pois não confere ao proprietário o direito de indenização. A perda da propriedade nesse caso tem como pressuposto o fato de que nela estão localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas. Consumada a expropriação, essas áreas são destinadas ao assentamento de colonos com vistas ao cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos.

O processo adotado para essa espécie de desapropriação está disciplinado pela Lei no. 8.257, de 26.11.91.

Objeto

Pode ser objeto da desapropriação tudo aquilo que seja objeto de propriedade. Isto é, todo bem, imóvel ou móvel, corpóreo ou incorpóreo, pode ser desapropriado. Portanto, não se desapropriam direitos em geral. Contudo, não são desapropriáveis direitos personalíssimos, como direito a honra, etc.

Efetivamente, estes não se definem por um conjunto patrimonial, antes se apresentam como verdadeiras projeções da personalidade do indivíduo, ou consistem em expressões de um seu status jurídico, como o pátrio poder e a cidadania, por exemplo. Também não se desapropria o dinheiro, a moeda corrente do país, por ser este o próprio meio de pagamento do bem expropriado. Toda via, dinheiro estrangeiro ou moedas raras podem ser desapropriados.

Igualmente não são desapropriáveis pessoas, mas apenas os bens ou direitos acionários relativos a elas, porque desapropriar significa tirar a propriedade, isto é, despojar de um objeto jurídico, e em direito, pessoas são sujeitos, não objetos.

Bens Públicos

Podem ser desapropriados, nas seguintes condições e formas: “a União poderá desapropriar bens dos Estados, Municípios e DF. Já os Estados poderão expropriar bens dos municípios. J´, as recíprocas não são verdadeiras. Há necessidade de autorização legislativa do poder expropriante para que se realizem tais desapropriações”.

Além disso, municípios não podem desapropriar bens das autarquias federais e dos Estados, e estes não podem desapropriar bens das autarquias da União.

Dispõe o art.2o.¶3o. do Decreto-lei 3.3655 que municípios, DF, e Estados não podem sem prévia autorização, expedida por decreto do presidente da república, expropriar ações, cotas e direitos representativos do capital de instituições e empresas cujo funcionamento dependa de autorização e se subordine à sua fiscalização.

Bens de entidades de Administração Indireta

A desapropriação de bens dessas entidades por entidades maiores, não encontra obstáculo na disciplina, e ao contrário, guarda compatibilidade com o que dispõe o art.2o, ¶2o do decreto-lei no. 3.365/41, é possível que a União desaproprie bem de uma sociedade de economia mista estadual, ou de uma empresa pública municipal. O mesmo se dá na relação entre o Estado e entidades administrativas municipais.

Margens dos rios navegáveis

De acordo com o prof. Hely Lopes Meirelles, tais faixas terrestres, consideradas faixas reservadas pelo Código de Águas, integram a propriedade privada, estando destacadas apenas para uso da Administração, em forma de servidão administrativa. Além do mais, a transição dos imóveis ribeirinhos alcançaria esses terrenos marginais, de modo que deveria o registro ser observado pelo Poder Público.

Mas, diferentemente do STF, que expôs o contrário na Súmula no. 479: “as margens dos rios navegáveis são de domínio público, insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídas de indenização”.

Processo Judicial:

Das Partes

O sujeito ativo é sempre o poder público ou pessoa privada que exerce função delegada, quando autorizada em lei ou no contrato. O proprietário nunca atua como parte no pólo ativo da relação processual expropriatória. Pode ser, por exemplo, a União, Estados, sociedade de economia mista, fundação pública, concessionário de serviço público, etc.

O sujeito passivo da ação será sempre o proprietário do bem a ser desapropriado.

Pretensão

A pretensão do expropriante é a de consumar a transferência do bem desapropriado para seu patrimônio. Para tanto, deve sua petição inicial conter indispensavelmente a oferta do preço (art.282, do CPC).

A petição tem que ser formulada por quem tenha legitimidade constitucional ou legal. No caso de desapropriação por utilidade pública, a legitimação é sempre ampla, sendo conferida a todas as pessoas federativas e “aquelas que exercem função delegada, desde que autorizadas na forma da lei”.

Na desapropriação por interesse social, são legitimadas as mesmas pessoas que podem promover a ação expropriatória por utilidade pública. Há, no entanto duas exceções: a primeira é a ação de desapropriação com fins urbanísticos – parte legítima para propor a ação é exclusivamente o Município; a segunda é a ação de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, prevista no art. 184 da CF: parte legítima é a União.

Contestação

O Decreto-Lei nº.3.365, de 21 de junho de 1941, regula os casos de ação de desapropriação e, dentre outras providências, no seu artigo 20 dispõe sobre a matéria que pode ser tratada, em sede de contestação, pelo proprietário/expropriado.

O decreto de utilidade pública ou de interesse social, embora, na sua forma, não apresente defeitos, poderá, quanto à substância, estar nulo. É o caso da inexistência de motivos. Em casos tais, o processo não comporta a matéria onde se discute a desapropriação, podendo o interessado, se assim o entender, socorrer-se das vias ordinárias, para cassar o ato maculado. Caso já tenha ocorrido a incorporação do imóvel à Fazenda Pública, seja Municipal, Estadual ou Federal, com o registro do mandado de transcrição no Cartório de Imóveis competente, só será possível ao expropriado buscar perdas e danos, estando frustradas quaisquer outras medidas de cunho reivindicatório.

Indenização

Indenização Justa, prevista no art.5o, XXIV, da CF é aquela que corresponde real e efetivamente ao valor do bem expropriado, ou seja, aquela cuja importância deixe o expropriado absolutamente indene, sem prejuízo algum em seu patrimônio.

Para que assim se configure, devem incluir juros moratórios, juros compensatórios, correção monetária, honorários advocatícios e outras despesas, nas condições e termos seguintes.

Tipos de Juros

Juros moratórios na desapropriação são os devidos pelo Poder Público ao expropriado pela demora do pagamento do valor da indenização. Calcula-se a razão de 6% ao ano, conforme o art.1.062 do Código Civil, e conforme a Súmula 70 do STJ conta-se a partir do trânsito julgado da sentença condenatória.

Juros compensatórios são os devidos pelo expropriante ao expropriado, a título de compensação pela perda antecipada da posse que este haja sofrido. Como a justa indenização só é paga no final da lide, o expropriado, cuja posse foi subtraída no início dela, se não fosse pelos juros compensatórios, ficaria onerado injustamente com a perda antecipada da utilização do bem.

Correção Monetária

Cabe correção monetária do valor da indenização quando transcorra mais de um ano, contando a partir do laudo de avaliação do bem, antes do efetivo pagamento dela. É o que dispõe o ¶2o do art 26 do Decreto-lei 3.365, ao estatuir: “Decorrido prazo superior a um ano a partir da avaliação, o juiz ou tribunal, antes da decisão final, determinará a correção monetária do valor apurado”.

Pode ser pedida em qualquer fase ou instância, a qualquer momento que preceda o efetivo pagamento da indenização, desde que haja transcorrido um ano e dia do laudo de avaliação. O juiz ou Tribunal podem de ofício determinar sua aplicação, isto é, independentemente de pedido da parte.

Honorários Advocatícios

Sendo a Fazenda condenada a pagar valor superior ao oferecido, são devidos honorários advocatícios. Se assim não o fora, o expropriado teria que suportar um desfalque patrimonial proveniente das despesas com seu patrono e, em conseqüência, a indenização deixaria de ser justa, por não cobrir o ônus diretamente acarretado pela desapropriação.

Os honorários são calculados sobre a diferença entre o valor oferecido pelo expropriante e aquele apurado como justo na avaliação, ambos corrigidos monetariamente. Não há, contudo, na jurisprudência qualquer orientação firmada sobre o quantum percentual a ser aplicado.

Jurisprudência

DESAPROPRIAÇÃO – ENFITEUSE – INDENIZAÇÃO – CRITÉRIO. Na enfiteuse, há um direito de propriedade e um direito real limitado; se o imóvel foreiro for desapropriado, a indenização é devida a ambos os titulares. Havendo confusão entre quem desapropria e quem mantém o bem sob regime de enfiteuse, a indenização do enfiteuta corresponde ao valor do imóvel menos o equivalente a dez foros e um laudêmio.

Conclusão

Como pudemos observar, a desapropriação é uma intervenção drástica da propriedade privada, decorrente de preceito constitucional e infraconstitucional utilizado pelo poder público para viabilizar os objetivos da administração, proporcionando aos populares o bem estar e o equilíbrio social visto que este instituto promove a distribuição de terra (reforma agrária) fazendo com que se viabilize a materialização da função social da propriedade questão primeira dos direitos de Segunda geração (igualdade).

Como não poderia deixar de ser, embora nossa carta Magna trate da livre iniciativa, do livre comércio, o nosso Estado-bem estar procura fazer acomodações com o intervencionismo sem pecar pelas doutrinas extremistas como o liberalismo (não intervenção) e o socialismo (intervenção praticamente total); procurando através do princípio implícito da proporcionalidade concretizar as belas palavras contidas no preâmbulo da constituição “(…) para instituir um estado democrático de direito, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade a segurança e o bem-estar, o desenvolvimento a igualdade e a justiça (…)”.

Bibliografia

• CARVALHO, José dos Santos de , Filho. Direito Administrativo, 4a edição, ed. Lumen Juris.

• MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. Ed. Malheiros, 1993.

• MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 12a edição. Ed. Malheiros.

• DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. Ed. 2001. Editora Atlas

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