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terça-feira, dezembro 10, 2024

PNEUMONIA DOMICILIAR GRAVE

A pneumonia continua sendo considerada importante causa de morbidade e mortalidade em uni­dade de terapia intensiva (UTI), apesar das modernas técnicas de diagnóstico e tratamento emprega­das. Uma ampla variedade de agentes anteriormente considerados não patogênicos, hoje são isola­dos a partir de hospedeiros imunodeprimidos, assim como em indivíduos com função imune preserva­da. A mudança de susceptibilidade aos diferentes antimicrobianos colabora também para aumentar o problema do tratamento desta entidade.
A pneumonia se desenvolve quando um organismo patogênico, presente nas secreções da orofaringe, nas partículas de aerosol inaladas ou na circulação ultrapassa os diversos mecanismos de defesa das vias aéreas superiores e inferiores. Quando tais agentes atingem a superfície alveolar são responsáveis por resposta inflamatória local, com produção de exsudato e posterior consolida­ção. O Streptococcus pneumoniae é considerado o microorganismo mais comumente identificado, porém, outros agentes podem ser responsáveis, tais como: outras bactérias, vírus, fungos e parasi­tas. No passado, as pneumonias foram classificadas em “típicas” (Strep. pneumoniae) e “atípicas” (Mycoplasma pneumoniae, Chamydia pneumoniae, Legionella pneumophila). Trabalhos recentes mostram que essa separação não é possível clinicamente, podendo os sintomas ditos típicos (ex: tosse com expectoração purulenta) e os ditos atípicos (ex: cefaléia, mialgias) ocorrer indistintamente nos dois grupos. O mesmo acontece em relação às alterações radiográficas. Com finalidade didática as pneumonias podem ser classificadas em comunitárias (ou domiciliares) e nosocomiais.
A pneumonia domiciliar acomete mais de 4 milhões de pessoas por ano nos EUA, sendo responsável por mais de 600.000 internações, no mesmo período, naquele país. Atualmente ela constitui a sexta causa de morte, sendo a primeira entre as doenças infecciosas. A mortalidade da pneumonia comunitária é muito variada, em função do amplo espectro de gravidade com que pode se apresentar. Ela varia de índices de 1 a 5% em pacientes que não necessitam de internação, atingin­do 25 a 50% naqueles com necessidade de internação em unidades de tratamento intensivo.

2. Aspectos Microbiológicos

A identificação do organismo responsável pela Pneumonia Domiciliar Grave (PDG) é dificultada pela necessidade de antibioticoterapia empírica obrigatória nesta situação. A maioria dos estudos isola o Strep. pneumoniae como agente etiológico seguido por Legionella, Hemophilus influenzae, Mycoplasma pneumoniae, Staphylococcus aureus, Klebsiella pneumoniae e outros agentes. A identificação precisa do agente depende, em grande parte, da técnica de diagnóstico utilizada. Embora a maioria dos estudos utilize métodos convencionais de diagnóstico (escarro, cultura de líquido pleural), outros utilizam técnicas mais sensíveis, tais como Lavado Bronco-Alveolar (LBA) ou punção transtorácica.

3. Diagnóstico

O diagnóstico de pneumonia é baseado na presença de infiltrado na radiografia de tórax, novo ou progressivo, associado à presença de sintomas e sinais de infecção respiratória. Os principais sinto­mas e sinais são: tosse, produção de escarro e febre. Outros achados também podem estar presen­tes, isoladamente ou não: dor torácica, dispnéia, alteração do nível de consciência (principalmente em idosos), propedêutica de consolidação pulmonar, leucocitose ou leucopenia.
O diagnóstico etiológico das pneumonias é difícil de ser estabelecido, mesmo quando toda propedêutica está disponível. O diagnóstico de certeza é dado apenas quando se isola um agente em líquido estéril (hemocultura, cultura de líquido pleural, punção transtorácica); através de testes sorológicos ou quando se isola em secreção respiratória (escarro, aspirado traqueal ou brônquico) um agente que não coloniza as vias aéreas e/ou cavidade oral (ex: M. tuberculosis, P carinii, Paracoccidioides brasiliensis, Legionella sp, Mycoplasma pneumoniae).
Em função disso, em toda pneumonia grave, com critérios de internação, deve-se realizar hemocultura, mesmo sendo sua positividade ao redor de 20%. Na presença de derrame pleural, esse deve ser puncionado na tentativa de se estabelecer o diagnóstico etiológico. O aspirado percutâneo raramente é realizado em função do alto risco de pneumotórax. Os testes sorológicos são realizados em estudos epidemiológicos, pois sua positividade ocorre apenas na convalescença, não ajudando na condução do tratamento em pacientes específicos. A pesquisa dos agentes citados acima é realizada sempre que houver suspeita clínica.
A análise do escarro (bacterioscopia e cultura), embora advogada por alguns autores, apresenta grandes limitações: 10 a 30% dos pacientes apresentam tosse não produtiva; apenas 25% das amos­tras são adequadas (> 25 PMN / campo de pequeno aumento e < 5 células epiteliais / campo de pequeno aumento); o uso prévio de antibióticos reduz a sensibilidade e a especificidade (favorece a colonização por enterobactérias na cavidade oral); há necessidade de processamento rápido e ade­quado (nem sempre disponível).
A colheita de material através de broncoscopia também pode ser realizada. Pacientes graves, mas ainda fora da ventilação mecânica, podem deteriorar a função pulmonar durante o procedimento e evolu­írem para a necessidade de ventilação mecânica. Em função disso, acabamos reservando a broncoscopia como procedimento de diagnóstico etiológico das pneumonias para pacientes já intubados e ventilados mecanicamente, ou naqueles que não estão evoluindo adequadamente (além de colher material para pesquisa etiológica, pode-se identificar fatores que estejam prejudicando a recuperação, como por exem­plo, neoplasia ou corpo estranho).
Os principais diagnósticos diferenciais de pneumonia são: bronquite aguda, sinusite, infecção brônquica em portador de doença pulmonar prévia (ex: DPOC, bronquiectasias), câncer de pulmão, embolia pulmonar, tuberculose pulmonar, insuficiência cardíaca, bronquiolite obliterante com pneu­monia organizante (BOOP), doenças pulmonares difusas (ex: vasculites, hemorragia alveolar, síndrome do desconforto pulmonar agudo, sarcoidose).

4. Critérios de gravidade

Critérios de Gravidade das Pneumonias Domiciliares

Dados de História
• Idade acima de 65 anos
• Presença de co-morbidades
• (DPOC, Ins. Renal Crônica, ICC, Ins. Hepática, Diabetes, Alcoolismo, Desnutrição, Esplenectomia, Torpor ou coma)

Dados de Exame Físico
• FR acima de 30 resp/min
• PA Sistólica < 90 mmHg
• Temperatura acima de 38,5°C
• Foco infeccioso extra-pulmonar
• Confusão mental
• Torpor ou coma

Dados Laboratoriais
• 30.000 < leucócitos < 4.000 / mm3
• PaO2 <60 mmHg ou PaCO2 >50 mmHg
• Necessidade de Ventilação Mecânica
• Cr > 1,2 mg/dL ou Ur > 20 mg/dL
• Htc < 30% ou Hb < 9g/dL
• Evidência de sepse ou disfunção perfusional
• Acidose metabólica
• Alargamento do TTPA
• Plaquetopenia
• Aumento dos produtos de degradação do fibrinogênio

Dados Radiográficos
• Acometimento bilateral
• Presença de cavitação
• Presença de derrame pleural

Em 1993, a Sociedade Torácica Americana (ATS) estabeleceu em conferência de consenso dez critérios para a admissão em UTI de pacientes com pneumonia comunitária. São eles: freqüência respiratória > 30 rpm na admissão, PaO2/FIO2 < 250 mmHg, necessidade de ventilação mecânica, envolvimento bilateral ou de múltiplos lobos, piora radiográfica nas primeiras 48 horas (> 50%), cho­que circulatório (PAS < 90 mmHg ou PAD < 60 mmHg), necessidade de vasopressores por mais de 4 horas, débito urinário menor que 20 ml/h (ou < 80ml em 4h) e necessidade de diálise.
Em um estudo realizado em Barcelona em 1998, por Ewig e cols, esses critérios foram validados, sendo observado que são sensíveis, porém não específicos, ou seja, os pacientes que necessitam de UTI realmente apresentam os critérios citados, mas outros, passíveis de tratamento em enfermarias, também os apresentavam.

5. TRATAMENTO

Em função das dificuldades de diagnóstico etiológico e da necessidade de tratamento antimicrobiano rápido, o tratamento inicial das pneumonias comunitárias é sempre empírico, tendo por base estudos epidemiológicos prévios.
As recomendações terapêuticas para as pneumonias comunitárias mais largamente difundidas são as da Sociedade Torácica Americana (ATS, 1993) e da Sociedade Americana de Doenças Infec­ciosas (ISDA, 1998), as quais estão descritas abaixo:

– Esquemas de Antibioticoterapia Empírica

(Pacientes com necessidade de internação sem indicação de UTI)

Recomendações da ATS

Cefalosporina de 2a ou 3a geração + Macrolídeo (opcional)

Recomendações da ISDA

Cefotaxima ou Ceftriaxona ou Beta-lactâmico + inibidor da beta-lactamase + Macrolídeo (opcional) ou Quinolona com ação anti-pneumocócica isolada (opcional)

(Pacientes com necessidade de internação em UTI)

Recomendações da ATS

Macrolídeo + Cefalosporina de 3a geração com ação anti-pseudomonas
ou
outra droga com ação anti-pseudomonas (Carbapenem ou Ciprofloxacina)

Recomendações da ISDA

Macrolídeo ou Quinolona com ação anti-pneumocócica + Cefotaxima ou Ceftriaxona ou Beta-lactâmico+inibidor da beta-lactamase

No entanto, a presença de alguns fatores podem modificar os esquemas terapêuticos como:

• Presença de doença estrutural pulmonar (aumenta a possibilidade de pseudomonas): penicilina anti-pseudomonas ou carbapenem ou cefepime associados a macrolídeo ou quinolona com ação anti-pneumocócica associada a aminoglicosídeo

· Alergia a penicilina: quinolona com ação anti-pneumocócica

• Suspeita de aspiração: quinolona com ação anti-pneumocócica associada a clindamicina (ou metronidazol) ou beta-lactâmico+inibidor da beta-lactamase isolado.

6. Referências bibliográficas

1. American Thoracic Society. Guidelines for the initial management of adults with community-acquired pneumonia: diagnosis, assessment of severity, and initial antimicrobial therapy. Am Rev Respir Dis, 148:1418-1426, 1993.

2. Austrian R. Pneumococcal pneumonia. Diagnostic, epidemiologic, therapeutic and prophylactic considerations. Chest, 90:738-743, 1986.

3. Bartlett JG, Breiman RF, Mandell LA, File TM. Community-acquired pneumonia in adults: guidelines for management. CID, 26:811-838, 1998.

4. Ewig S, Ruiz M, Mensa J, et al. Severe community-acquired pneumonia. Assessment of severity criteria. Am J Respir Crit Care Med, 158:1102-1108, 1998.

5. Fine MJ, Smith MA, Carson CA, et al. Prognosis and outcomes of patients with community-acquired pneumonia. A meta-analysis. JAMA, 10:134-141, 1996.

6. Leeper KV, Torres A. Community-acquired pneumonia in the intensive care unit. Clin Chest Med, 16:155-171, 1995.

7. Weingarten SR, Riedinger MS, Hobson P. Evaluation of a pneumonia practice guideline in an

interventional trial. Am J Respir Crit Care Med, 153:1110-1115, 1996.

8. Consenso Brasileiro de Pneumonias em Indivíduos Adultos Imunocompetentes. Jornal de

Pneumologia 27 (Supl 1) 2001

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