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quarta-feira, abril 17, 2024

RELIGIAO

O papel que as crenças religiosas desempenham na vida social.

O estudo da religião é tema constitutivo e fundador da sociologia. Tanto Karl Marx, como Emile Durkheim e Max Weber se interessaram pela elaboração de teorias visando compreender aspectos da vida religiosa e sua influência na sociedade.

Os estudos produzidos por Weber, porém, sem dúvida alguma tiveram maior amplitude teórica e empírica. Weber analisou e comparou diversas religiões que existiram e que ainda existem no mundo, avaliando o papel que as crenças religiosas exercem na conduta dos indivíduos em sociedade. Num plano mais geral, o autor desvelou o potencial que a religião tem de provocar transformações na ordem social, sejam elas na esfera da economia, da política ou ainda da cultura.

A sociologia compreensiva
Weber jamais aceitou os pressupostos do materialismo histórico (teoria elaborada por Karl Marx e Frederich Engels) como único modelo teórico-metodológico válido para compreensão da realidade social.

De acordo com a teoria marxista, a forma como o homem produz e reproduz sua sobrevivência (ou seja, a maneira como busca satisfazer suas necessidades materiais, indispensáveis à manutenção da própria vida) exerce uma influência determinante sobre as outras esferas da vida social, tais como a religião, a cultura, os costumes, as instituições políticas e jurídicas, a ideologia e etc.

A sociologia compreensiva formulada por Weber se contrapõe ao determinismo econômico ao enfatizar que nem sempre as diversas esferas da vida social derivam, ou estão subordinadas, à estrutura econômica de uma sociedade. Há casos em que ocorre o inverso, isto é, as idéias, valores éticos e concepções de mundo (ou seja, as representações sociais) podem desempenhar um papel crucial na produção da vida material.

Religiosidade e racionalidade econômica
Weber atribuiu às crenças e valores religiosos um papel importante na conduta dos indivíduos em sociedade. Num dos seus livros mais proeminentes, “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, ele defendeu a tese de que a religião protestante exerceu uma poderosa influência no surgimento do modo de produção capitalista.

Com base em dados estatísticos extraídos da sociedade americana, ele demonstra que naquele país, os líderes do mundo dos negócios e os proprietários de capitais eram, na maioria dos casos, adeptos do protestantismo. Weber descreveu e analisou os valores e princípios éticos constitutivos da crença religiosa protestante e apontou sua adequação à racionalidade inerente ao empreendimento capitalista.

Etos calvinista e espírito do capitalismo
A Reforma Protestante (século 16) foi um movimento religioso que se contrapôs aos preceitos e dogmas do catolicismo. A partir dela, surgiram uma multiplicidade de seitas protestantes, entre elas as de vertente calvinista, cujo líder foi o francês João Calvino.

Weber observou que a expansão das seitas calvinistas na Inglaterra coincidiu com o aparecimento do modo de produção capitalista. Os preceitos religiosos constitutivos da doutrina calvinista levaram seus adeptos a adotarem um estilo de vida metódico em todos os aspectos da vida, denominado por Weber de ascetismo.

O etos de vida, característico do ascetismo calvinista, levava os crentes a valorizarem o trabalho secular (mundano), o lucro e a acumulação de riquezas materiais. Enquanto o católico buscava assegurar a salvação pela virtude, pelo arrependimento e pela penitência, os adeptos do calvinismo, e do protestantismo de modo geral, viviam sem saber se seriam salvos ou condenados.

Essa incerteza levava-os a buscarem, no decorrer de suas vidas, possíveis sinais da concessão da graça divina. O enriquecimento econômico, por exemplo, era um sinal que Deus daria aos predestinados à salvação, aos “escolhidos”. Por conta disso, os calvinistas desenvolveram um rígido e disciplinado modo vida, que os levavam a concentrarem todos seus esforços na busca pela acumulação material.

As atividades econômicas peculiares ao empreendimento capitalista – ou seja, a extração pacífica da mais-valia (do lucro), através da compra e remuneração da mão de obra do trabalhador livre -, foram muito beneficiadas porque se adequaram aos padrões do estilo de vida dos crentes protestantes.

O etos calvinista concebe o trabalho como uma vocação. A disciplina moral calvinista levava os crentes a pouparem seus ganhos econômicos, ao mesmo tempo em que eram inibidos de usarem os lucros para o consumo de bens luxuosos. Por isso, os lucros geralmente eram reinvestidos no próprio empreendimento capitalista, gerando um movimento cíclico de acumulação/reinvestimento/acumulação.

Afinidade eletiva
Weber emprega o conceito de afinidade eletiva a fim de explicar a influência que os valores religiosos calvinistas exerceram no sentido de “desencadear” o capitalismo. Uma vez tendo sido desencadeado, os valores e práticas religiosas calvinistas deixam de ser “determinantes” para a permanência e continuidade do capitalismo.

O conceito de afinidade eletiva é mais complexo do que a concepção de “causas determinantes”. Há uma correspondência entre o etos calvinista (espírito do capitalismo) e o empreendimento capitalista, mas é impossível apresentar uma explicação com base nos pressupostos de “causa” e “efeito”.

Religiões orientais
É interessante compararmos “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo” com outros estudos de Weber, em especial aqueles que se referem às religiões asiáticas como, por exemplo, o hinduísmo e outras tantas religiões que são à base das sociedades de castas.

Nestes casos, a religião serviria para manter toda uma ordem social e econômica acentuadamente hierarquizada e estática, ou seja, sem qualquer possibilidade de haver mobilidade e mudança social. O caso da Índia é interessante.

Há décadas o Partido Comunista da Índia, considerado uma das grandes forças políticas daquele país, tentou em vão aplicar programas políticos de melhoria das condições de vida das populações mais pobres. Sempre houve uma enorme resistência social que levou ao fracassou inúmeros programas políticos de caráter socialista (que preconizavam a igualdade e justiça social) porque a sociedade de castas está fortemente assentada sobre preceitos religiosos muito arraigados, que concebem as desigualdades e diferenças sociais como manifestação da vontade divina.

Fonte: Uol
Autor: Renato Cancian

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